sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Notas explicativas dos balanços ganharam tamanho e perderam transparência


As cada vez mais extensas notas explicativas constantes nos balanços das empresas brasileiras refletem melhor sua situação financeira ou complicam ainda mais a vida de quem precisa entendê-la, como os investidores? A indagação foi o ponto de partida de uma pesquisa feita com 366 companhias não financeiras na qual se avaliaram 638 itens de divulgação. O resultado do estudo foi apresentado em 11/11/2013 pela professora de contabilidade e controladoria Edilene Santana Santos, da Escola de Administração de Empresas de São Paulo (Eaesp) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), durante sua exposição no X Seminário Internacional CPC Normas Contábeis Internacionais, organizado em São Paulo pela Fundação de Apoio ao Comitê de Pronunciamentos Contábeis (FACPC).

A conclusão foi desanimadora. Somente 16% das empresas pesquisadas forneceram as informações conforme os critérios de transparência estabelecidos pelos órgãos reguladores. Quem lê os balanços passou a despender muito mais tempo para completar essa tarefa, sem que isso significasse entender melhor as demonstrações ou ter acesso a dados mais relevantes. “Os investidores pedem melhores informações, e não mais informações”, afirmou Aldo Bertolucci, membro observador do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) e representante da Confederação Nacional da Indústria (CNI), para quem as notas explicativas dobraram de tamanho desde a adoção das normas internacionais de contabilidade (IFRS, na sigla em inglês).

O problema não se restringe ao Brasil. Segundo Edilene, um levantamento realizado pela Securities and Exchange Commission (SEC) — congênere norte-americana da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) — com 183 empresas de diversos países mostrou numerosas deficiências em suas notas explicativas. Duas grandes companhias telefônicas dão o tom das distorções. A britânica Vodafone escreveu as suas em 44 páginas. A Portugal Telecom precisou de mais de 100 folhas. Apesar de ter ocupado menos da metade do espaço de sua concorrente lusitana, as explicações da Vodafone foram consideradas melhores e mais adequadas às normas que regem os balanços.

“No mundo todo, houve crescimento no volume de dados das notas explicativas, porém com queda na qualidade das informações”, disse Amaro Luiz de Oliveira Gomes, membro do conselho do International Accounting Standards Board (IASB, o Comitê Internacional de Normas de Contabilidade). A entidade promoveu um seminário em janeiro, em Londres, na Inglaterra, a fim de tratar do problema e oferecer sugestões para aprimorar as notas explicativas. Uma delas é esclarecer a aplicação do princípio de materialidade e, com base nele, publicar somente informações concretas.

De acordo com Amaro Gomes, percebe-se que, sobretudo nos primeiros anos depois da adoção das IFRS (normas internacionais de contabilidade estabelecidas pelo IASB), ocorre nas notas explicativas o que vem sendo chamado de checklist (lista de verificação): cada pronunciamento do IASB é entendido como obrigação de divulgação, sem levar em conta a materialidade do fato. Em decorrência disso, redigem-se textos que mais complicam que esclarecem as razões do desempenho da empresa. Há casos de companhias que simplesmente reproduzem nas notas explicativas as normas baixadas pelo IASB, sem nenhum valor informativo.

No âmbito doméstico, o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) vai reunir-se em dezembro para propor medidas que melhorem a qualidade das notas explicativas e submetê-las à consulta pública. “Temos de buscar formas mais equilibradas e menos custosas para isso”, afirmou Aldo Bertolucci, da CNI, para quem o Brasil ainda é um país medieval em termos de publicação de balanços, em razão da obrigatoriedade de que ainda sejam impressos em jornais, mesmo com a popularização da internet.

Ana Novaes, diretora da CVM, explicou que a publicação dos balanços em jornais é uma exigência estabelecida em lei e isso só pode ser mudado pelo Congresso Nacional. A forma de divulgação de fatos relevantes, porém, está no âmbito das atribuições da CVM, que realizou consulta pública sobre a possibilidade de usar portais de notícias na internet para esse fim. A audiência pública foi encerrada em 10/10/2013 e agora em fase de análise das manifestações.

Quanto às notas explicativas, Ana Novaes foi taxativa. Para ela, não vale pôr a culpa da prolixidade dos textos às exigências dos órgãos reguladores. “A exposição dos riscos financeiros da Sadia estava registrada em suas demonstrações contábeis, porém não de forma clara o suficiente para o público interessado. Deu no que deu”, exemplificou. A Sadia teve prejuízos bilionários no final de 2008 com operações cambiais que só não a levaram à bancarrota porque a empresa acabou sendo absorvida pela concorrente Perdigão, no começo do ano seguinte, na operação que resultou na criação da BRF. “Por isso, as notas explicativas têm de ser claras, relevantes e sem abobrinhas”, resumiu Ana Novaes.

Fonte: Revista Dedução

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