Sob
o pretexto de injetar maior transparência à atividade econômica, o Congresso
agilizou os encaminhamentos do Projeto de Lei 10.044/2018 que, na prática, vai
aumentar a burocracia para os empreendedores. Isso na contracorrente das
recorrentes demandas por simplificação da sociedade brasileira.
Se
o texto foi aprovado, só será possível abrir uma empresa após reconhecimento
das assinaturas de todos os sócios por um tabelião de notas. O detalhe é que o
projeto determina o reconhecimento presencial das assinaturas.
A
intervenção do tabelionato é prevista também para qualquer ato necessário ao
funcionamento da empresa, como eventual mudança de sócios, e também para
extinção das atividades.
O
PL 10.044 foi aprovado no Senado e passou pela Comissão de Desenvolvimento
Econômico da Câmara na quarta-feira (28/11). Encontra-se agora tramitando em
caráter conclusivo na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), última etapa
antes de virar lei.
Hoje,
os atos constitutivos necessários para o funcionamento de uma empresa não
precisam ser presenciais e são realizados diretamente no cartório de registros.
Alencar
Burti, presidente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) critica o excesso
de interferência sobre atividade empresarial. “É mais uma obrigação que
burocratiza e encarece o processo e, inclusive, anula lei aprovada
recentemente, que dispensa reconhecimento de firma para vários procedimentos”,
diz Burti.
É
sintomático ao Legislativo brasileiro a falta de coerência entre suas ações. A
legislação à qual o presidente da ACSP se refere é a Lei n° 13.726/2018, que
proibiu a órgãos públicos exigirem reconhecimento de firma e cópia autenticada
de documentos, medida que tem potencial para simplificar a elaboração de
contratos sociais.
É,
por enquanto, potencial porque, no ponto em que se encontra, ainda precisa de uma regulamentação que
especifique que os cartórios também estão proibidos de exigirem reconhecimento de
firma. Ainda assim, é uma lei que visa a desburocratização.
No
entanto, em questão de semanas, senadores aprovaram o PL 10.044 e os deputados
pedem urgência na tramitação da proposta que segue no sentido oposto, criando
mais empecilhos burocráticos para o empresariado.
“Esse
projeto (PL 10.044) surpreendeu a todos. Faltam duas semanas para encerramento
das atividades Parlamentares, e as frentes que defendem os interesses dos
empresários estavam desmobilizadas. Não tínhamos deputados em número suficiente
para evitar sua aprovação na Comissão de Desenvolvimento Econômico”, disse o
deputado Walter Iihoshi (PSD-SP), que votou contra a proposta.
Para
Iihoshi, a justificativa dos parlamentares que apoiaram o projeto -o impacto
que a medida supostamente teria no combate à corrupção – não faz sentido diante
das ferramentas tecnológicas que estão hoje à disposição dos órgãos públicos, a
exemplo do Sped, Nota Fiscal eletrônica, eSocial.
Há
também exigências da Receita Federal criadas em 2016, como a necessidade de as
empresas identificarem o proprietário “beneficiário” da companhia, que tem
ajudado a combater a lavagem de dinheiro e a ocultação de patrimônio.
“Com
todos os mecanismos que já existem não há necessidade de criar mais
dificuldades à atividade empresarial, ainda que sob o pretexto de se combater
irregularidades”, afirma Iihoshi.
O
autor do PL 10.044, o deputado Milton Monti (PR-SP), diz que o projeto é
importante porque inibiria contratos de gaveta e o uso de laranjas uma vez que
“ao serem submetidos a um tabelião de notas, os atos e negócios jurídicos
estarão sempre à disposição pública.”
Já
Alencar Burti acredita que a medida só irá ampliar a interferência dos
cartórios sobre a livre iniciativa.
“É
necessária uma revisão dos penduricalhos que já oneram as taxas cartoriais,
destinados a finalidades estranhas aos serviços prestados, e que representam
tributação disfarçada sobre os usuários”, afirma o presidente da ACSP e da
Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp).
A
partir desta terça-feira (4/12), a CCJ da Câmara dos Deputados passa a acolher
emendas dos parlamentares ao PL 10.044. O prazo para inserções se estende por
cinco sessões, quando o texto será votado em definitivo.
Para
o professor de direito tributário da USP, Luis Eduardo Schoueri, coordenador do
Conselho de Altos Estudos de Finanças e Tributação (Caeft), da ACSP, o projeto
desestimula a atividade empresarial.
“É
surpreendente que os senadores tenham aprovado um projeto que aumenta ainda
mais o Custo Brasil (dificuldades estruturais, burocráticas e econômicas que
encarecem o investimento no país). É preciso mobilizar as entidades
empresariais para evitar que mais uma burocracia seja criada”, diz Schoueri.
Fonte:
Diário do Comércio
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