Quando
entramos em uma recessão, logo surgem dois movimentos. Do lado do consumidor,
as prioridades e os gastos encolhem. Do lado da empresa, corte de despesas,
redução de preços e investimentos suspensos.
Nessa
hora, a pressão para a diminuição de custos leva a cortes indiscriminados e
falar em investimento se torna quase palavrão. Pouca gente lembra que as crises
terminam uma hora e precisará se manter competitivo para voltar ao jogo.
Como
se costuma dizer, há o risco real de jogar fora o bebê junto com a água do
banho.
O
dilema curto prazo versus longo prazo se apresenta também para as grandes
empresas, como foi flagrado na pesquisa anual As Marcas Mais Valiosas do
Brasil, da consultoria Interbrand.
A
pesquisa constatou que as empresas listadas no topo do ranking foram as que
mantiveram os investimentos estratégicos em 2015. Quem não teve esse cuidado,
despencou. A preocupação comum a todas foi manter a fidelidade dos clientes e
continuar a ser a marca de preferência quando a crise passar.
Para
quem está no sufoco, como a grande maioria dos pequenos empresários no momento,
trata-se de uma tarefa dura. Como identificar as áreas críticas em que a falta
de investimento pode ser fatal ao futuro da empresa?
Para
encontrar respostas, fizemos a mesma coisa que o paulistano Rogério Tassitani,
sócio-diretor da loja Ferrowidia – buscar ajuda de consultor. Saiba o que os
especialistas em gestão recomendam e entenda como o empresário manteve as
rédeas do negócio em períodos de baixo crescimento.
VISÃO GERAL
Controlar
despesas deveria ser parte da prática normal de uma empresa, reforçam todos os
consultores. Mas só ganha importância para a maioria dos empreendedores quando
a recessão aperta e ficam às voltas com um plano de cortes. Conselho dos
especialistas – não perca a visão geral e o que é estratégico. Veja as
diretrizes que eles recomendam:
“Coloque
esforços onde terá mais retorno” - Para Adriano Correa, sócio de advisory da
BDO, o pequeno empresário deve ter três cuidados: “focar nos produtos corretos,
investir nos melhores recursos e se livrar dos clientes que dão prejuízo”. Para
fazer essa análise, precisa colocar tudo na ponta do lápis. “A ideia é garantir
a manutenção do fluxo de caixa. Neste momento, ele é mais importante que o
lucro.”
“Preserve
o que é diferente e atrai o cliente” - Francisco Guglielme, conselheiro de
empresas e professor de Gestão de PMEs na FGV-SP, recomenda priorizar a
satisfação dos clientes e a proteção contra novos concorrentes. “Para os
pequenos, trata-se de aguentar o tempo que for possível até a retomada do
crescimento. Para isso, é necessário se conformar com a perda de
lucratividade.”
“Comece
a olhar o que é essencial e identifique o vai se traduzir em receita” -
Adriano Vargas, diretor da PwC, lembra que há um olhar equivocado sobre o
conceito de despesas. “Os empresários costumam pegar um departamento já deficitário
e cortar mais, sem separar os custos críticos dos não críticos”, disse. Um
exemplo simbólico é o cafezinho, um clássico dos cortes de baixo resultado e
impacto emocional nocivo sobre o clima interno.
“Identifique
a estrutura necessária de pessoas, competências e equipamentos para conseguir
entregar o que vende” - Vanildo Veras, vice-presidente da Aescon-SP,
contabilista e consultor, ressalta que, para tomar essa decisão, “o empresário
precisa ampliar a visão do negócio. Se fizer a gestão do custo pelo custo, pode
perder a capacidade de atender quem está comprando”.
“Separe
o que é operacional do que é estratégico e invista no estratégico” - Fabiano
Nagamatsu, consultor do Sebrae, considera que como uma das razões para os
cortes indiscriminados a confusão que as empresas ainda fazem entre custos e
investimentos. “Investimentos”, ele lembra, “estão ligados ao planejamento de
longo prazo e ao que vai garantir o futuro da empresa. Custos são os recursos
necessários para operacionalizar o negócio, como salários, aluguel, luz, água,
telefonia.”
O QUE PRESERVAR NA
TEMPESTADE
1 - Eficiência na gestão
Avalie
a necessidade de investimentos em relação a dois pontos: registrar, mensurar e
avaliar os custos operacionais e administrativos; e melhorar processos. São
ganhos invisíveis, que despertam pouco interesse nos bons tempos, mas farão
toda a diferença para chegar a uma empresa enxuta e eficiente.
Não
sabe por onde começar? Só tem o Excel para acompanhar o negócio? Para dar conta
das tarefas, considere os seguintes caminhos: contratar um consultor de gestão;
implantar um sistema de gestão financeira; usar melhor os serviços de
assessoria contábil.
Com
estes reforços, será possível atacar várias frentes em busca de eficiência:
- Ter o acompanhamento estreito dos resultados da empresa
- Revisitar os custos fixos
- Verificar o escopo dos contratos para uma renegociação
- Revisar os serviços para uma possível terceirização ou internalização
- Fazer o planejamento tributário
- Revisar os sistemas elétrico e hidráulico e o plano de telefonia
- Conferir se o estoque está alinhado com a demanda
2 - Ampliação dos canais
de venda
Na
crise, reforçar ou preservar o departamento comercial se torna uma operação de
guerra para as pequenas empresas. Embora a equipe de vendas seja a responsável
pela conquista dos clientes e faturamento da empresa, um comportamento
recorrente dos pequenos empresários é trocá-la por outra mais barata ou
simplesmente extingui-la. Se o vendedor se paga, não é um custo.
A
hora é de ampliar a estrutura de venda, que pressupõe uma solução completa –
estratégia comercial, canal físico e digital, capacitação dos vendedores e
ferramentas para fazer acompanhamento de resultados.
3 - Cuidados com a imagem
Os
investimentos em marketing e comunicação costumam estar entre as primeiras
vítimas dos planos de corte de custos. A decisão é equivocada exatamente porque
não se trata de custo, mas de investimento. Destrói-se um longo trabalho de
construção de imagem com esta decisão.
Os
riscos são grandes. Cortar verbas de marketing pode ser danoso para as vendas.
O vácuo gerado pela falta de comunicação pode levar à impressão de que a
empresa entrou em crise ou fechou.
Em
vez de cortar a área do orçamento, suas verbas devem ser revisadas com um olhar
estratégico. Assim, quando o crescimento voltar, sua empresa será a primeira a
ser lembrada pelos clientes.
4 - Dimensionar o valor da
equipe
Ter
uma equipe competente exige um investimento alto de tempo e dinheiro, que não é
levado em conta quando se decide por uma redução indiscriminada de despesas.
Demissão de funcionários faz parte das medidas automáticas tomadas por muitas
empresas em dificuldades, com altos riscos para a capacidade de entrega e de
atendimento.
Há
um jeito certo de promover cortes de pessoal?
Olhando o longo prazo, é preciso avaliar o quanto a empresa vai perder
de conhecimento e de eficiência com as demissões. A decisão deve ser precedida
de um esforço de avaliação para não perder os mais qualificados. Se for
inevitável, investir em um plano de saída diminui o drama do momento e mantém
as portas abertas quando as coisas melhorarem.
Depois
do corte, é fundamental criar mecanismos de valorização para quem fica. Os
consultores recomendam que os empreendedores se empenhem em manter um bom clima
interno. Isto precisa de comunicação e transparência para que os funcionários
se sintam envolvidos no desafio de manter a empresa aberta.
5 - Melhorar o contato
BtoB
Um
empresário não pode se isolar no seu negócio, há muito o que dividir e aprender
com clientes, fornecedores e até concorrentes. Vale a pena esse investimento.
Lembrar
que todos estão passando pelas mesmas dificuldades dá margem a relações
ganha-ganha. Manter mais proximidade com os pares e buscar soluções em conjunto
facilita renegociar contratos. Trata-se de uma prática mais saudável do que
apertar um fornecedor ou trocá-lo.
O
fornecedor deve ser visto como um aliado que pode ajudar a entender o problema
do cliente e a encontrar uma nova solução, como fez o grupo atacadista Martins,
ao convocar os 40 principais fornecedores do negócio para buscar saídas para um
ano difícil.
Os
riscos da inflexibilidade podem ser a quebra de confiança entre os parceiros, o
desabastecimento e a queda da qualidade do serviço/produto.
6 - Inovar e manter a
qualidade do produto
A
necessidade de redução de custos leva à tentação de substituir os componentes
dos produtos ou de diminuir o tamanho ou escopo, com o risco de cair a
qualidade. A contrapartida está na análise fria do portfólio para avaliar quais
produtos trazem maior retorno para o caixa e olhar os custos de produção para
torná-lo mais competitivo.
Junto
com a necessidade de melhorar a gestão, a preservação da qualidade abre espaço
para o investimento em inovação, ferramenta de negócios pouco considerada pelos
empreendedores durante os bons tempos.
Uma
nova maneira de fazer as coisas pode ser aplicada ao marketing, à linha de
produção, aos processos administrativos, à logística. Deixar de criar
diferenciais para o produto pode levar à obsolescência.
7 - Atenção ao movimento
dos clientes
Um
antídoto ao risco de perder o cliente é se aprofundar nos seus hábitos de
consumo e perfil. Não se preocupou em saber quantos clientes aparecem todo dia?
Qual o período de fluxo mais intenso e qual o valor do tíquete médio? Agora é a
hora de investir nesse conhecimento.
Ter
sistemas de gestão de clientes e de cobrança ajuda a descobrir os mais
rentáveis e a manter um controle rígido da inadimplência. Quando o mercado não está
competitivo, é ainda mais importante ficar atento ao que o usuário quer de
fato, para que não vá buscar o produto no concorrente.
Fonte:
Diário do Comércio – SP
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