Observando
o ritmo das inovações e a tendência mundial, é impossível não se surpreender
com os rápidos avanços tecnológicos que vêm ocorrendo a cada dia. Trata-se de
um processo irreversível, sinalizador de que entramos em um novo tempo. Esses
avanços têm impactado quase todas as áreas da atividade humana, podendo ocorrer
de várias formas e em várias magnitudes. Além disso, vale destacar que muitos
deles ainda não são inteiramente conhecidos.
Sabe-se
que, atualmente, o aperfeiçoamento intelectual e a atualização constante são
indispensáveis em qualquer profissão, dada a velocidade com que as mudanças se
processam. Assim, é preciso ficar atento à mudança no perfil dos profissionais,
exigida pelo mercado. Maior qualificação técnica, visão de negócios e
habilidades analíticas e de comunicação estão entre os requisitos essenciais
exigidos pelo mercado. E, nessa rapidez das transformações, o profissional
contábil está sendo chamado a sair do nível operacional e se aproximar de um
nível mais estratégico nas organizações.
Conforme
o relatório do Fórum Econômico Mundial, The Future of Jobs Report 2018,
publicado em setembro de 2018, quatro avanços tecnológicos devem dominar os
próximos quatro anos, influenciando positivamente o ambiente de negócios. São
eles: internet móvel de alta velocidade; inteligência artificial; big data
analytics; e a tecnologia em nuvem. Segundo a maioria das empresas que
participaram da pesquisa, a adoção dessas tecnologias se dará de forma
acelerada até 2022, demandando investimentos consideráveis.
Sem
dúvida, são inúmeros os benefícios advindos do avanço da tecnologia. Aspectos
como segurança, tempestividade e qualidade das informações estão em pauta a
todo o momento. Com os dispositivos móveis e a tecnologia em nuvem, temos
acesso imediato a um incontável número de informações, pessoas e serviços.
Conhecemos mais, aprendemos e nos comunicamos rapidamente. Resolvemos problemas
relacionados a trabalhos repetitivos e retrabalho, aumentando a precisão e os
acertos. Há ainda um acesso mais fácil a lugares limitados aos humanos e
avanços significativos no campo da ciência e da medicina.
Por
outro lado, é preciso ter cautela com os riscos que também existem em qualquer
processo de mudanças, especialmente pela velocidade com que estão ocorrendo.
Chamada de quarta Revolução Industrial, essa fase de transição, que acorre
rapidamente entre a Era Industrial e Digital, como todo período de grandes
mudanças, tem o seu lado negativo. Questões como quais são os limites e
controles da Inteligência Artificial (IA) e quem são os responsáveis pelos
processos e pelas possíveis falhas que possam acontecer nos sistemas permeiam,
constantemente, as discussões sobre o tema e se tornam cada vez mais sérias.
Nessa última questão, podemos nos lembrar dos carros que se locomovem sem
motorista, que já são realidade em alguns países – caso ocorra um acidente,
quem seria o responsável?
Em
pesquisa recente divulgada pela DigiCert, realizada com mais de 700 empresas de
diversos setores dos Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha, França e Japão, a
segurança (82%) e a privacidade (78%) aparecem como as principais preocupações
das empresas que implementaram a Internet das Coisas (IoT). Entre as empresas
que estão enfrentando dificuldades na segurança da IoT, 25% relataram perdas de
cerca de US$34 milhões nos últimos dois anos; já nas que estão se saindo melhor
com a segurança, os seguintes comportamentos-chave foram verificados:
criptografia de dados, autenticação de dispositivos, cuidados com armazenamento
e atualização.
De
acordo com o relatório The Global Risks Report 2019, publicado pelo Fórum
Econômico Mundial, a vulnerabilidade tecnológica continua ocupando lugar de
destaque no cenário de riscos globais. A Pesquisa de Percepção de Riscos
Globais (na sigla em inglês GRPS) ressalta as preocupações sobre fraude de
dados e ataques cibernéticos. Cerca de dois terços dos entrevistados entre as
comunidades de participação do Fórum, as redes profissionais de seu Conselho
Consultivo e os membros do Instituto de Gerenciamento de Risco esperam que os
riscos associados a notícias falsas e a roubo de identidade aumentem em 2019.
Segundo o relatório, ocorreram grandes violações de dados em 2018; foram ainda
reveladas novas fraquezas de hardware; e pesquisas apontaram para os possíveis
usos da IA para projetar ataques cibernéticos mais potentes.
É
preciso enfatizar que, por se tratar de algo relativamente novo, a Inteligência
Artificial ainda desperta muitos debates quanto aos aspectos éticos, sociais e
morais que envolvem seu uso. Nick Bostrom e Eliezer Yudkowsky, em seu estudo
The Ethics of Artificial Intelligence, destacam alguns critérios fundamentais
que devem ser considerados em um algoritmo destinado a substituir o julgamento
humano das funções sociais, sendo eles: responsabilidade, transparência,
auditabilidade, incorruptibilidade e previsibilidade. Os autores salientam
ainda que os sistema de IA não possuem status moral e, assim, as restrições
morais a que estamos sujeitos nas nossas relações com esses sistemas se baseiam
em nossa responsabilidade para com os outros seres.
No
âmbito da Contabilidade inserida na Era digital, os princípios éticos
fundamentais e o compromisso com a sociedade nos levam a uma reflexão sobre o
que vem ocorrendo com os serviços de contabilidade “on-line”. Com início nos
Estados Unidos e na Europa, a Contabilidade “Faça você mesmo”, em inglês Do it
yourself (DIY), vem ganhando espaço no mercado brasileiro. Nessa modalidade, o
empresário é responsável por incluir em um sistema interligado ao profissional
da contabilidade todas as informações sobre as operações realizadas pela
empresa, e é esse processo que tem despertado controvérsias, pois aumenta o
risco de distorções nas informações produzidas pelo sistema, uma vez que a
inserção dos dados contábeis não é realizada sob a supervisão direta de um
profissional da contabilidade.
O
contador, no papel de preparador das demonstrações contábeis e, também, o
auditor, no papel de revisor dessas mesmas demonstrações, têm o compromisso
público de levar toda a verdade aos usuários das informações produzidas. Esta é
a postura que a sociedade espera do profissional da contabilidade e é, também,
a única razão pela qual a profissão é regulamentada em lei.
Discorrendo
sobre outros pontos que merecem destaque quanto aos riscos envolvidos no avanço
tecnológico, destacamos a ameaça da utilização de máquinas que possam
substituir a mão de obra; o alto custo financeiro que demanda a produção de
equipamentos/sistemas com IA; a vulnerabilidade dos sistemas; e situações que
violam os códigos de ética.
De
modo particular, o ponto que se refere à perda de empregos tem despertado
muitas discussões. Alguns estudos já estimam em que patamar isso aconteceria. O
Instituto McKinsey, em estudo de 2017, simulou alguns cenários que indicam o
impacto do avanço tecnológico em relação à rapidez de sua adoção. Seus
resultados apontam que entre 400 e 800 milhões de indivíduos poderão perder
seus empregos até 2030, tomando por base os cenários de adoção moderada ou
adoção rápida da automação.
O
Fórum Econômico Mundial de 2018 também explorou intensivamente esse tema.
Segundo o estudo publicado por organizadores do Fórum, intitulado Towards a
Reskilling Revolution: A Future of Jobs for All, somente nos Estados Unidos
cerca de 1,4 milhão de empregos serão afetados pelas novas tecnologias até
2026, dos quais 57% pertencem a mulheres. Um lado positivo é que, com uma
adequada capacitação, 95% dos trabalhadores em situação de risco seriam
realocados no mercado. Assim, fica evidente a necessidade de que os
trabalhadores se “reformem” para se adaptarem e minimizarem o risco de
desemprego.
Tendo
em vista que, nos últimos anos, a mídia vem trazendo uma visão negativa e
ameaçadora dos impactos da tecnologia sobre a profissão contábil, é oportuno
respondermos novamente a seguinte indagação: a tecnologia acabará com a profissão?
A resposta é Não! E dizemos por quê. A inovação tecnológica está contribuindo
para transformar, de uma vez por todas, a imagem e participação do profissional
da contabilidade no mundo dos negócios, reforçando o seu papel estratégico na
tomada de decisões. Vista como um sistema de informação acerca do patrimônio e
das situações econômica e financeira da empresa, a Contabilidade se tornou um
instrumento essencial na gestão. O desafio está em se preparar para assumir
esse novo papel.
Além
disso, em matéria intitulada “Mercado de trabalho: as profissões que mais devem
contratar em 2019”, publicada recentemente (11/1) pela revista Veja, a
profissão de contador aparece entre as que obtiveram maior número de
contratações entre janeiro e novembro de 2018 – foram preenchidas 16.958 vagas.
A matéria ainda destaca algumas profissões que devem estar em alta este ano,
dentre elas as de especialista tributário e gerente de planejamento financeiro,
que podem ser exploradas pelo contador.
É
preciso estar claro que tarefas, como entender o cliente em suas necessidades;
elaborar a política contábil de um empreendimento ou de instituições; e
explorar dados e analisá-los cuidadosamente, de modo a transformá-los em
planejamento, contribuindo para o desenvolvimento econômico, definitivamente
não são e não serão atribuições de um robô.
Vale
ressaltar que o CFC implementou várias ações no decorrer de 2018, com intuito
de esclarecer que os avanços tecnológicos devem ser vistos muito mais como
aliados do profissional da contabilidade, além de constituírem uma oportunidade
de aperfeiçoamento e atualização contínua. Em palestras, artigos e entrevistas,
temos difundido a ideia de que a profissão contábil não irá acabar para aqueles
que souberam se reinventar e dominar as novas ferramentas tecnológicas de
quarta geração.
Uma
ação recente do Conselho Federal de Contabilidade foi criar uma Comissão
Permanente para o acompanhamento das mudanças tecnológicas e de sua influência
na profissão contábil, buscando analisar e tratar os impactos da inteligência
artificial e vislumbrar horizontes para a nossa profissão. Aprovada pela
Portaria CFC n.º 15, de 8 de fevereiro de 2019, a Comissão tem a atribuição de
estudar e propor medidas para minimizar os efeitos negativos desse processo de
intensas mudanças, ao mesmo tempo que buscará evidenciar e disseminar as
melhorias trazidas por esses avanços para o aprimoramento e eficiência dos
afazeres do profissional da contabilidade.
É
natural que, como toda mudança, essas inovações venham acompanhadas de certa
complexidade e, até mesmo, resistência por parte dos receptores. Mas, no
decorrer do tempo, o profissional já está percebendo os vários benefícios
gerados por essas novidades. Por exemplo, no campo operacional, os softwares de
gestão contábil podem otimizar processos e facilitar tarefas rotineiras,
deixando mais tempo disponível para que o profissional se dedique à maximização
dos resultados da gestão. Ademais, no campo intelectual, as mudanças provêm a
oportunidade de o profissional se ‘reformar’ a cada dia – a busca por uma
educação continuada se tornará cada vez mais essencial nesse processo.
De
fato, a quarta revolução industrial veio para auxiliar a profissão contábil e,
não, destruí-la, e estreitar as relações entre a profissão e a academia será
fundamental para atravessar esse caminho de intensas mudanças com êxito. Já com
uma visão de futuro, um dos pilares da gestão do Conselho é investir no
aprimoramento da educação e na capacitação dos profissionais. Não há outro
caminho a não ser entrar nesse ritmo de aperfeiçoamento e inovações, e o
profissional que não fizer isso ficará para trás e, provavelmente, terá que
mudar de profissão.
Por
Zulmir Ivânio Breda - Presidente do CFC
Fonte:
Conselho Federal de Contabilidade
Nenhum comentário:
Postar um comentário