A
extinção do Ministério do Trabalho no governo Jair Bolsonaro (PSL) deverá
colocar a superpoderosa Secretaria de Políticas Públicas de Emprego nas mãos do
futuro ministro da Economia, Paulo Guedes.
Com
as atribuições do órgão sob sua responsabilidade, Guedes poderá levar a cabo
uma das promessas de campanha do presidente eleito: a criação da carteira de
trabalho verde e amarela.
A
nova carteira, que existirá em concomitância com a atual, vai assegurar apenas
direitos constitucionais, como férias remuneradas, 13º salário e FGTS (Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço).
Além
da carteira, a secretaria concentra programas como seguro-desemprego e abono
salarial, e o Codefat (conselho do Fundo de Amparo ao Trabalhador), o que
amplia a força de Guedes. Em 2018, o FAT teve previsão orçamentária de R$ 76,8
bilhões.
O
rearranjo ministerial com essa estrutura bilionária integra um conjunto de
mudanças planejadas pelos assessores de Bolsonaro dentro de um projeto maior,
que prevê o aprofundamento da reforma trabalhista de Michel Temer.
As
novas regras da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) completaram neste
domingo (11) um ano. O principal efeito da reforma se deu no volume de
processos na Justiça do Trabalho (veja
matéria).
Na
esteira das idéias liberais de Guedes, a equipe de Bolsonaro que trata do tema
tem a meta de avançar na flexibilização dos contratos de trabalho, sob o
argumento de que o fim do engessamento tende a ampliar o número de vagas.
Críticos,
porém, prevêem um esvaziamento da CLT caso seja criada a carteira verde e
amarela, na qual seriam anotados contratos com regime mais flexível, em que o
trabalhador aceite menos direitos trabalhistas em troca de uma remuneração
maior.
Quaisquer
direitos e deveres que estejam fora da Constituição – como, por exemplo, a
duração da jornada e o regime de férias – seriam fixados em negociação entre
empregador e trabalhador, caso a caso, em uma exacerbação do “negociado sobre o
legislado”.
A
princípio, a escolha entre as duas carteiras caberia apenas aos novos
trabalhadores que estão chegando ao mercado e ainda não tiveram vínculo
empregatício.
A
carteira verde e amarela também seria a entrada para o regime de Previdência de
capitalização (em que a aposentadoria é resultado do que o trabalhador foi
capaz de poupar ao longo da vida).
Na
campanha, Guedes disse à Globonews que a carteira azul representaria o emprego
tradicional. “Porta da esquerda: você tem sindicato, legislação trabalhista
para te proteger, encargos.”
A
CLT valeria para os contratos da carteira azul. Do “sistema antigo”. A verde e
amarela seria o “novo sistema”.
“Se
houver para os mais jovens um mera opção, na carteira verde e amarela, as
empresas vão aceitar quem tem a verde e amarela e, em 20 anos, não teremos
trabalhadores da CLT”, afirmou Guilherme Feliciano, presidente da Anamatra
(associação dos juízes trabalhistas) e professor da USP (Universidade de São
Paulo).
“Ela
torna obsoleta a CLT, torna letra morta a CLT. Preocupa sob vários aspectos”.
Bolsonaro
tem criticado com frequência o que vê como um excesso de direitos garantidos
pela legislação atual.
“Aqui
no Brasil tem direito para tudo, só não tem emprego”, disse o presidente eleito
em transmissão ao vivo em redes sociais na sexta-feira (09/11).
“Já
ouvi a esquerda falar ‘ele quer acabar com direito trabalhista’. Então, antes
que falem besteira essa pessoal da esquerda e alguns órgãos de imprensa, os
direitos trabalhistas estão no artigo 7º da Constituição”, afirmou.
“Está
cheio de direito lá. Não tem como tirar, não vou dar murro em ponta de faca, é
cláusula pétrea. É o país do direito. Você tem tanto direito e não tem emprego.
O que queremos? Destravar a economia”, afirmou Bolsonaro.
A
adoção de contratos mais flexíveis ajudou a gerar mais emprego em países como
Alemanha e Espanha, segundo o economista Bruno Ottoni, do Ibre/FGV (Instituto
Brasileiro de Economia) e da consultoria IDados.
Os
primeiros resultados costumam levar cinco anos para aparecer. No Brasil, neste
primeiro ano de reforma trabalhista, o efeito sobre a geração de postos de
trabalho foi abaixo, na avaliação de Ottoni.
Segundo
dados do Ministério do Trabalho, as novas modalidades de emprego (contratos
intermitentes e parciais) geraram 55 mil postos de trabalho até setembro.
Já
o trabalho informal (sem carteira assinada) e o trabalho por conta própria
abrigaram mais 1,186 milhão de pessoas nos 12 meses até setembro, segundo o
IBGE. Quase 12 milhões disseram que buscaram emprego e não conseguiram.
Para
esse contingente, a carteira verde e amarela não teria utilidade, a menos que
pudesse abarcar os trabalhadores que já estão na ativa.
Essa,
porém, não é a proposta dos economistas de Bolsonaro. O mais provável, segundo
o desenho feito até agora, é que quem optar pela carteira verde e amarela siga
com ela durante a carreira, até mesmo por não contribuir para o atual sistema
de Previdência.
O
chefe do Ministério Público do Trabalho, Ronaldo Fleury, critica o argumento de
mais flexibilização como motor de emprego. “[Isso] não vai aumentar a
empregabilidade nem diminuir a informalidade. Só vai tirar direitos.”
O
professor de direito do trabalho da USP, Flávio Roberto Batista, por sua vez,
vê a proposta da nova carteira como “um devaneio”.
Interlocutores
de Bolsonaro falam em prosseguir com a modernização da lei trabalhista. A atual
reforma, contudo, não teria ajustes, e suas alterações não seriam revistas.
Futuras
mudanças trabalhistas seriam capitaneadas pelo superministério da Economia de
Guedes, que reunirá funções do Trabalho, Planejamento e Mdic (Indústria,
Comércio Exterior e Serviços).
Outras
atividades da pasta a ser extinta, como fiscalização, caberão ao Ministério da
Justiça, de Sergio Moro.
Fonte:
Folha de S. Paulo
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