Em
vez de facilitar trâmites e reduzir a burocracia, a nova fase em que a
contabilidade brasileira ingressa está tomando um rumo oposto. Na medida em que
a tecnologia substitui o papel, cada vez mais informações são exigidas nos
documentos a serem entregues para o governo. E quem deve ser mais prejudicado
durante a transição são justamente os pequenos e médios empresários, na
avaliação de Sérgio Approbato Machado Júnior, presidente do Sescon-SP, entidade
que representa as empresas de contabilidade do Estado.
Desde
a implementação da nota fiscal eletrônica, em 2008, o governo federal vem
acrescentando "controles extremamente sofisticados", afirma ele. As
novas obrigações, dentro do guarda-chuva do Sistema Público de Escrituração
Digital (Sped), acabam sendo mais complexas.
Como
cada documento eletrônico fica conectado com outros documentos e há uma
infinidade de regras, cumprir a legislação acaba sendo uma tarefa impraticável,
afirma Approbato. "A legislação é um absurdo completo. Todo dia tem
novidade ou mudança de algum parâmetro. Nenhuma empresa está preparada para
lidar com isso."
Nesse
ano, inclusive, há duas novidades que são quebra de paradigma para o setor.
A
primeira delas é a Medida Provisória 627, sancionada pela presidente Dilma no
dia 14 de maio. O texto, com cerca de cem artigos e 60 páginas, altera a
legislação tributária federal de vários impostos, como o Imposto de Renda
Pessoa Jurídica (IRPJ), a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), a
Contribuição para o PIS/PASEP e a Contribuição para o Financiamento da
Seguridade Social (Cofins).
Outra
alteração é o fim do Regime Tributário de Transição (RTT).
Para
o presidente do Sescon-SP, o fim do RTT e a adoção do padrão internacional de
relatórios financeiros (IFRS), a princípio, é uma novidade boa. Com a mudança,
os estrangeiros podem compreender com mais facilidade os demonstrativos
financeiros de empresas brasileiras. O lado ruim, na visão dele, é que as
novidades chegam com muito ainda a ser resolvido. "Veja o RTT. Era um
regime transitório. Mas durou cinco anos", disse.
A
segunda novidade do ano - além da sanção da MP 627 - é a implantação do
eSocial, projeto do governo federal também conhecido como folha de pagamento
digital. A data de início da obrigatoriedade estava programada para janeiro deste
ano, então foi prorrogada para abril e atualmente está indefinida. Para
Approbato, essa postergação da obrigatoriedade foi positiva, pois as empresas
não estavam preparadas para operar com o eSocial.
Na
visão dele, as empresas de menor porte não têm condições técnicas para cumprir
as exigências. "O Brasil é um continente. Mesmo em São Paulo existem
situações diversas. Em municípios distantes falta acesso à internet", diz
o presidente do Sescon-SP. Para ele, o governo precisa considerar melhor a
realidade das empresas de pequeno porte ou localizadas em regiões remotas.
Um
sintoma do despreparo do empresariado seria a baixa adesão aos sistemas de
gestão empresarial, os programas de computador conhecidos pela sigla ERP.
Segundo ele, cerca de 70% das informações exigidas pelas novas obrigações
eletrônicas são provenientes dos sistemas de informação. Os escritório de
contabilidade acabam gerando apenas os outros 30%. "Ter um ERP hoje é que
nem falar inglês. É obrigação para qualquer atividade."
Outro
impasse, na visão de Approbato, é que o governo vem iniciando os testes das
novas obrigações eletrônicos em empresas de grande porte, que possuem
departamentos de recursos humanos, contabilidade e tecnologia muito bem
estruturados. No Brasil, todavia, 99% das 6,3 milhões de empresas são micro ou
pequenas empresas, de acordo com dados do Sebrae. "Essa grande maioria das
empresas não tem departamento de recursos humanos. Eles terceirizam a folha de
pagamento para escritórios de contabilidade."
Para
chegar nas micro e pequenas empresas, Approbato entende que o governo federal
deveria trabalhar mais na conscientização do empresariado. A divulgação das
mudanças de contabilidade, contudo, não vem sendo feita e acaba virando
atribuição dos contadores. Esse seria o caso do eSocial, que vem sendo estudado
já há três anos, mas segue desconhecido.
A
conscientização do empresariado, entretanto, esbarra no primeiro empecilho
mencionado pelo presidente do Sescon-SP: a complexidade das novas regra.
"Faltou um estudo para tentar diminuir a burocracia, com uma
racionalização dos dados", diz ele. Como o objetivo do governo é amarrar
as informações num sistema único, ele defende que seria lógico, por exemplo,
unificar o número de identificação da pessoa física. "Temos números de RG,
CPF, PIS/Pasep, NIT e SUS. Para que tantos?"
A
variedade dos números de identificação, para ele, é apenas um exemplo da
confusão de regras e normas vistas na contabilidade. O eSocial inclui 2.450
registros diferentes.
Fonte:
DCI – SP
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