O
ajuste fiscal anunciado para recuperar as contas públicas do País impõe pesadas
perdas ao setor produtivo, põe por terra todo um trabalho de adaptação de
empresas e entidades ao sistema de desonerações, distorce a realidade e, por
fim, joga no palco das discussões paradoxos que as autoridades não conseguem
explicar.
O
programa de desoneração começou a ser implantado em 2011 com o objetivo de
desenvolver a economia e manter baixas as taxas de desemprego, alterando a
forma pela qual tributava as empresas para o financiamento da Previdência
Social. Como é sabido, as despesas previdenciárias historicamente são
financiadas por contribuições de empregados e empregadores. No regime
tradicional, empregadores pagam contribuições equivalentes a 20% da folha de pagamento
das empresas.
A
desoneração da folha de pagamentos substituiu essa contribuição patronal por
outro tributo incidente sobre o faturamento da empresa, e não mais sobre a
folha de pagamentos, com alíquotas entre 1% e 2%, dependendo do setor da
economia.
Na
visão do governo, houve uma redução parcial do imposto pago, pois, de modo
geral, a receita gerada por essas alíquotas não compensava a perda advinda da
menor tributação sobre a folha. Isso significaria menos receita para o Erário e
alívio financeiro para o contribuinte. O Tesouro Nacional se comprometeu a
ressarcir a Previdência Social pela receita perdida.
Com
o ajuste, as desonerações praticamente desaparecem, pois as alíquotas passam de
1% para 2% e de 2% para 4,5%. Enfim, uma elevação de até 150%.
Emerge
daí o paradoxo: entre o que o governo anuncia pela mídia e o que ocorre na vida
das empresas. A mudança para o regime de desoneração prejudica
consideravelmente determinados setores e empresas, pois, a depender do ramo, de
número de funcionários, o novo sistema aumentou substancialmente a contribuição
para a Previdência.
Até
o recente pacote econômico, a desoneração era obrigatória. Agora passa a ser
optativa. A empresa pode continuar na desoneração, pagando mais que o dobro em
alguns casos, ou volta ao cálculo anterior da folha.
Isso
causa surpresa. Quando se implantou o sistema de desoneração da folha, um fato
se tornava evidente para quem trabalha na área contábil e mexe diretamente com
a folha de pagamento de todos os setores da economia: a desoneração não era
benéfica em muitos casos. Encarecia a tributação porque substituía o pagamento
sobre a folha pelo pagamento sobre o faturamento. Ao fazer o cálculo, a empresa
descobria que pagava mais. Para o patrão, essa situação aumentou, sim, o peso
da carga.
Um
dos exemplos é o setor moveleiro: na época do enquadramento obrigatório
comprovou que pagava mais tributo, enquanto outros setores também reclamavam.
Empresas
obrigadas a se modernizar em matéria de estrutura tecnológica sofreram com o
enquadramento obrigatório. Por exemplo, as do setor produtivo; quem tinha
muitos funcionários e comprou máquinas mais modernas, passou a reduzir o quadro
de funcionários para algo em torno de 70%. Com isso a empresa melhorou a
produção e a eficiência, aumentando o faturamento. Ao reduzir o quadro de
funcionários, também passou a pagar mais imposto. O esperado era reduzir
impostos, mas o efeito foi inverso, já que a incidência não é mais sobre a
folha.
Ora,
se uma grande parcela de empresas brasileiras passou a recolher mais tributos,
como a União anuncia que perdeu mais de R$ 25 bilhões com o programa?
Desde
o início, representantes do empreendedorismo batalharam para que as empresas
pudessem optar ou não pela desoneração, por uma questão de justiça tributária.
Mas o governo foi inflexível e manteve a obrigatoriedade. Os profissionais
contábeis perceberam tal desequilíbrio - alguns animais passaram a ser mais
iguais do que os outros, como em “A Revolução dos Bichos”, de George Orwell. Em
suma, o governo não seria inflexível se estivesse perdendo tanta receita, como
ensina a história.
Agora
que aumenta as alíquotas e praticamente elimina os benefícios, aceita a opção
por um ou outro regime. É fazer caridade com o bolso alheio. Por isso, não
causa surpresa a saída encontrada de aumentar a alíquota e deixar a escolha
livre, esperando que as empresas voltem ao regime antigo.
Foi
imenso o trabalho para se chegar a um consenso sobre a desoneração da folha,
uma vez que é sobre produtos - nesse caso o cálculo é mais burocrático. Mas
foram criados mecanismos para fazer este ajuste, pois é preciso saber do mix de
produtos da empresa, aqueles desonerados e o total da folha para, então,
aplicar o percentual correto. No início da vigência deu muito trabalho, gerou
muitas dúvidas, guias e demonstrativos tiveram de ser retificados, até que o
sistema fosse completamente absorvido. Agora, quando a situação parece mais
normalizada, as regras mudam novamente. E uma alíquota absurda desestimula as
empresas a permanecerem nesse regime.
Para
setores que não tiveram benefício com a desoneração, a volta ao sistema
original não será ruim. O setor moveleiro, claro, não quer mais esse regime.
Para muitos será até benéfico. Para empresas de tecnologia e de contabilidade,
que tiveram de adaptar suas bases, sistemas e profissionais, foi um trabalho
desnecessário. A tendência é a de que, senão 100% das empresas, perto disso
volte ao regime antigo.
A
opção é positiva. De toda forma, as empresas precisam analisar as contas para
ver o que é mais vantajoso para atividade. Com esta medida, de certa forma o
governo atendeu nosso pedido. Ao anunciar seu pacote, o ministro Joaquim Levy
afirmou que a desoneração havia sido “grosseira”, uma “brincadeira”.
Grosseiro
é o governo brincar com a Nação. Concedendo um benefício que não é tão benéfico
e punindo as empresas com a majoração de tributos para pagar um rombo
construído por ele, governo.
Fonte:
Revista Dedução
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