Quando o engenheiro Fabiano Palombo abriu a
Academia Jockey Clube, em São Carlos (SP), em junho de 2015, a prisão dos
presidentes da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, e da Andrade Gutierrez, Otávio
Marques de Azevedo, na Operação Lava-Jato, era um sinal claro de que a crise
brasileira teria vida longa. Mas Palombo planejava o negócio há meses e não
desistiu. No curto prazo, para reverter a situação e ampliar a clientela,
aumentou a quantidade de aulas oferecidas.
Um olhar desatento aprovaria a estratégia. A
academia lotou e Palombo chegou a ter 650 alunos. A medida, no entanto, teve um
efeito negativo. "O aumento dos gastos não era justificado. O que eu
cobrava não pagava os custos extras. Tínhamos um plano mensal de R$ 70 para uma
atividade e outro de R$ 80 para quem quisesse fazer todas. Houve procura, mas
não compensava", comenta.
Para salvar o negócio, Palombo buscou informações,
fez cursos, decidiu investir em propaganda e apostou em novas estratégias.
"Estamos refazendo os modelos de negócio e de gestão, sem receio de cortar
a oferta de atividades aos clientes. Eliminamos todas as atividades que não
davam lucro. Outra medida foi cortar todas as despesas que não tinham reflexo
sobre o atendimento.
O empresário decidiu também elevar as mensalidades,
depois de ouvir clientes e perceber que eles não valorizam preços baixos por
questionarem a qualidade do serviço. Os gastos com propaganda também cresceram.
O objetivo de comunicação é mostrar a importância da atividade física e de uma
vida mais saudável. "Vamos contratar uma nutricionista e um psicólogo para
oferecer serviço com maior valor agregado. Afinal, mesmo na crise precisamos
investir. Só temos que saber quanto e como", avalia.
A história de Palombo mostra que nem tudo parece
ser o que é. Afinal, ele tinha uma academia cheia e precisou abrir mão da
clientela - hoje são 200 clientes - e aumentar preços para poder almejar um
negócio lucrativo. Segundo especialistas, são justamente os momentos de crise
que expõem as vulnerabilidades de um negócio. Isso porque a recessão escancara
erros pouco visíveis - no caso de Palombo, a fragilidade do caixa, a busca do
cliente a qualquer preço e a falta de percepção do que é realmente importante
para a clientela desejada. Hoje, ele busca tomar decisões sempre embasado por
pesquisas.
Cortes
de custos sem critério deixam o negócio mais vulnerável
Em tempos de crise, é normal que empresários cortem
custos, mas consultores alertam que a atitude só vai fortalecer o negócio para
o momento da retomada da economia se for realizada com critério, como fez
Palombo depois de ser aconselhado pelo Sebrae-SP. Segundo o consultor da
entidade Adriano Campos, um erro bastante comum é o empresário ficar obcecado
em reduzir custos e não pensar na estratégia do empreendimento, buscando novos
públicos, e na melhoria do relacionamento com clientes.
Mauro Johashi, sócio da área de advisory da
consultoria BDO, diz que corte de custos deve ser realizado após o diagnóstico
criterioso sobre quais atividades geram valor e vantagem competitiva e também
depois de uma análise sobre o impacto do corte na demanda e na qualidade do
serviço. Neste contexto, muitos empresários assumem funções que não deveriam.
"Há donos que centralizam atividades e perdem o foco no que interessa, que
atuam desde a compra do papel higiênico até a administração", diz
Alexandre Prado, consultor da Núcleo Expansão.
Especialistas garantem que a "lição de
casa" pode gerar mudanças radicais, alertam que nem sempre dar um passo
para trás significa regredir e destacam que o ego não é um bom conselheiro.
Daliana Damaceno Gil de Oliveira que o diga. Ela é dona da Papel, Tesoura e
Festa, especializada em papelaria voltada a festas, como convites e lembranças,
e decidiu investir em um quiosque em um shopping center em Matão (SP) para ampliar
as vendas.
A empresária havia enxergado na crise uma
oportunidade de expansão de vendas, pois os clientes de festas infantis estavam
realizando esses eventos em casa. Por isso, Daliana decidiu montar um plano de
implementação de uma unidade em shopping e, como não tinha o dinheiro
suficiente para o investimento, buscou uma sócia. O maior problema é que ela
não analisou os riscos e as mudanças operacionais envolvidas.
Como o resultado foi bem diferente do que
imaginava, a empresária precisou desistir do ponto para cortar custos e gerar
fôlego de caixa, voltando a trabalhar em casa. Segundo ela, as redes sociais e
a internet passaram a ser a vitrine do negócio. "Os custos eram altos. Foi
uma pena, pois tratava-se de um projeto desenvolvido por bastante tempo.
Conseguimos ver que era uma situação econômica difícil, e não uma não aceitação
do produto e da marca", diz.
Segundo Daliana, ao dar um passo para trás, ela
vislumbrou uma oportunidade. "Muitas pessoas que faziam festas em bufês
passaram a fazer em casa para cortar custos. E, assim, começamos a oferecer
doces e bolos para a festa, além dos itens personalizados", conta. O ano
começou com o convite de um shopping para a reabertura do quiosque, mas Daliana
resolveu não aceitar. Ela prefere esperar mais um pouco e, enquanto isso,
ampliar os investimentos em marketing nas redes sociais.
Diferentemente de Palombo e Daliana, que tomaram
medidas para contornar a crise às vezes com decisões equivocadas, outro erro
comum dos empresários, segundo o consultor do Sebrae-SP, é esperar a situação
melhorar sem fazer nada. Segundo Campos, a quantidade de empresários que
demoram a reagir ou que nada fazem para reverter a situação chega a ser ainda
maior a daqueles que tomam decisões equivocadas.
A empresária Ana Rita Risitano, da Mult Comércio de
Portas, Esquadrias, em São Carlos (SP), quase correu esse risco devido à sua
forte confiança na marca e em processos. Ao longo de 2016, as vendas da
empresa, que superou três décadas de história, chegaram a cair 40%, depois de
dez anos de crescimento contínuo. Para sobreviver, conta Ana Rita, precisou
demitir colaboradores e reduzir o estoque.
Sua empresa não possuía indicadores financeiros, o
que dificultou a percepção correta do negócio. Após a busca da consultoria do
Sebrae-SP, ela promoveu mudanças na gestão de estoques, reduziu os gastos com
marketing e publicidade e buscou parcerias com fabricantes e implementou
política de recompensa e reconhecimento junto aos vendedores, o que garantiu
melhores resultados dos esforços de venda.
"Como todo o brasileiro que sempre espera o
melhor, fui acreditando que podia melhorar ao longo do ano de 2016. No primeiro
mês caiu um pouquinho, mas continuei com todas as ações e investimentos
previstos. Não acho que demorei, mas fui tomando medidas aos poucos. Não
reduzimos investimentos em marketing e divulgação, um dos motivos que acredito
que contribuíram para que não caíssemos ainda mais. Reduzimos em outros lados,
para conseguir manter a divulgação", ressalta.
Investimentos
em qualificação garantem bons resultados futuros
Para quem ainda não fez qualquer mudança para estar
pronto no pós-crise, Alexandre Prado adianta que um dos caminhos continua sendo
entender o fluxo financeiro da empresa, além de reduzir custos e investir na
qualificação profissional para o momento da retomada da economia. "Vi
empresas criando regras para uso correto de energia, uso racional de água e
corte de pessoal que não somava efetivamente no negócio. Essas empresas
buscaram entender seu fluxo financeiro e onde poderiam melhorar seu desempenho.
Quem fez este dever de casa também fez investimentos e, entre eles, na
qualificação do quadro de pessoal. É nesse período que se deve melhorar a
qualidade para em tempos de bonança ter profissionais prontos para tempos de
bons negócios", ensina.
Segundo o consultor, o problema mais corriqueiro
que é exposto durante momentos de crise é a miopia em relação ao caixa da
empresa, misturando finanças pessoais com os gastos do negócio, ou a perda de
controle dos gargalos na produção. "A não profissionalização dos quadros
por afetividade também prejudica o desempenho da empresa nesses momentos",
enumera o especialista.
Prado destaca ainda que não investir em TI ou
investir pesadamente leva àquela máxima de que é possível pecar pela falta ou
pelo excesso, o que é mais um sinal da centralização. Assim como não investir
em mídias sociais para alavancar a imagem da empresa. Ele destaca dois pontos
positivos mais corriqueiros em empresas que fizeram o dever de casa durante a
crise e agora estão fortalecidas. O primeiro é analisar e entender o fluxo de
caixa e o ciclo de vendas da empresa e o segundo é o mapeamento dos
desperdícios.
Fonte: DCI – SP
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