O
Brasil é um dos países com mais pluralidade religiosa no mundo, com mais de 80
mil entidades religiosas espalhadas por todo território nacional. Todos esses
espaços, ainda que sem fins lucrativos, ou seja, integrantes do terceiro setor,
devem estar em conformidade com as exigências fiscais. Contar com um contador
capaz de encaminhar desde a abertura dos templos até seu fechamento, passando
por obrigações acessórias, é cada vez mais necessário já que o cerco vem se
fechando sobre pessoas físicas e empresas. Todos devem estar dentro do que o
Fisco exige, alertam especialistas.
Embora
os católicos continuem sendo maioria no País, somando mais de 123 milhões de
brasileiros, os dados do Censo Demográfico 2010 - Características Gerais da
População, Religião e Pessoas com Deficiência, divulgado em 2012 pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelam uma grande diversidade
religiosa entre a população brasileira.
Na
última década, além dos evangélicos, grupo que mais cresceu no período,
passando de 15,4% para 22,2% e totalizando 42,3 milhões de pessoas no País,
também tiveram expansão os espíritas, que passaram de 1,3% para 2% e somaram
3,8 milhões em 2010; os que se declararam sem religião, que subiram de 7,4%
para 8%, ultrapassando os 15 milhões; e o conjunto pertencente a outras
religiosidades, que cresceu de 1,8% para 2,7%, totalizando pouco mais de 5
milhões de brasileiros. Os adeptos da umbanda e do candomblé mantiveram-se em
0,3% ao longo da década, representando quase 590 mil pessoas.
Conforme
pesquisa de 2010 elaborada pelo IBGE com o Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea), a Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais
(Abong) e o Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife), havia, até aquele
ano, 82,853 mil fundações privadas e associações sem fins lucrativos da
Categoria Religião. Atualmente, esse número deve ser ainda maior tendo em vista
que houve um boom de locais do segmento, principalmente de templos evangélicos
e casas espíritas, umbanda e candomblé.
O
contador Cristiano da Silva Bernardes viu o número de instituições religiosas
aumentar consideravelmente entre a sua carta de clientes. A Bernardes
Escritório Contábil fica situada em Viamão e presta serviços a aproximadamente
10 entidades de cunho religioso fixo, fora aqueles que procuram a empresa em
busca de consultoria para algum assunto específico. "As instituições se
deram conta que a sociedade está buscando doar e investir em entidades sérias,
legalizadas e que têm as contas sob controle. Todas as obrigações contábeis, no
caso desse segmento ajudam na administração desses espaços", sustenta
Bernardes.
Quais os impostos isentos
para o setor
Segundo
o artigo 150 da CF, os templos de qualquer culto são imunes de impostos
federais, estaduais e municipais, conforme a referida legislação:
>
Imposto sobre a Renda e Proventos de qualquer Natureza (IR)
>
Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS)
>
Imposto sobre Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU)
>
Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI)
>
Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA)
>
Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS)
>
Imposto Territorial Rural (ITR)
>
Imposto sobre Transmissão Causa Mortis ou Doação de Bens e Direitos (ITCD)
>
Imposto sobre Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis (ITBI)
>
Imposto sobre Importação (II)
>
Imposto sobre Exportação (IE)
No
Rio Grande do Sul, a Lei nº 14.223, sancionada em 2013, concede isenção do
Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nas contas relativas
à prestação de serviços de telefonia e ao fornecimento de energia elétrica
destinados aos templos de qualquer culto do Rio Grande do Sul.
CFC regulamenta as
obrigações fiscais
As
obrigações fiscais das entidades religiosas estão regulamentadas em normas do
Conselho Federal de Contabilidade (CFC) relacionadas ao terceiro setor. As
exigências são basicamente as mesmas, ainda que as entidades regularizadas
contem com isenção em certos impostos, como o Imposto Predial e Territorial
Urbano (IPTU) e o Imposto de Renda e não precise recolher o Imposto Sobre
Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) quando prestar serviços - quando
contrata, a entidade precisa fazer a retenção.
A
imunidade tributária é garantida pela Constituição Federal, a qual estabelece o
impedimento dos poderes tributadores de instituir tributos em relação a certos
entes ou em determinadas situações, ou seja, inexiste o fato gerador do
tributo. Conforme o artigo 150 da Constituição Federal, "sem prejuízo de
outras garantias asseguradas ao contribuinte é vedado à União, aos Estados, ao
Distrito Federal e aos Municípios instituir impostos sobre (...) templos de
qualquer culto".
No
Rio Grande do Sul, uma lei de abrangência estadual retira a cobrança de Imposto
sobre Circulação de Mercadorias e de Serviços (ICMS) da conta de energia
elétrica e de telefonia. Normalmente a instituição precisa conhecer a
legislação e exigir o desconto. É necessária a notificação da empresa de
energia e a comprovação, através de cópia do registro da entidade feito junto ao
Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas e Cadastro Nacional de Pessoa
Jurídica (CNPJ) emitido junto à Receita Federal.
Dentre
as obrigações acessórias, as entidades religiosas estão obrigadas a emitir a
Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF) no mês em que for
gerada receita acima de R$ 10 mil. Além disso, deve ser recolhido o PIS/Pasep
sobre a folha de pagamento, deve ser feita a Declaração do Imposto de Renda
Retido na Fonte (DIRF), a Escrituração Fiscal Digital (EFD) Contribuições e a
Escrituração Contábil Digital (ECD), também conhecida como Sped Contábil.
A
ECD substitui o livro diário, comumente encontrado naquelas entidades
religiosas mais antigas. Essa é uma das práticas que terá de ser modernizada,
assim como a prestação de todas as informações trabalhistas e previdenciárias
com a entrada em vigor do eSocial (Sistema de Escrituração Digital das
Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas).
O
contador Cristiano da Silva Bernardes chama atenção à importância de manter o
cadastro das entidades atualizado. "Mesmo as inativas têm de continuar
entregando a DCTF todos os anos", lembra o contador, salientando que mesmo
esses serviços devem ser cobrados e valorizados pelo profissional contábil.
Instituições têm de se
preparar à entrada em vigor do eSocial
A
entrada em vigor em 2018 do eSocial deve obrigar as entidades religiosas a
ingressarem em um novo tempo de maior transparência e de cumprimento à risca
das legislações trabalhistas e previdenciárias. A obrigação deverá recair
também sobre esse segmento do terceiro setor e forçar uma mudança de cultura na
relação entre contadores e fundações.
O
contador Ibes Eron Vaz, da Contenge - Contabilidade, Engenharia e Gestão lembra
que caso a organização religiosa conte com empregados - inclusive domésticos, é
obrigatório o pagamento de todos os direitos trabalhistas. A partir de 2018
todo o processo de contratação de um colaborador, alterações posteriores de
cargos, afastamentos, até as saídas de férias, atestados de saúde ocupacional,
rescisões de contrato, ações trabalhistas e dissídios e contratação de
prestadores de serviços (pessoas físicas e jurídicas), devem ser transmitidos
regularmente ao sistema.
Caberá
aos gestores dessas organizações, na maior parte das vezes a própria liderança
religiosa, responder pela gestão dessas informações. "Muitas vezes essas
pessoas não conhecem os trâmites legais, daí a relevância de manter contato
constante com as organizações", pontua Vaz.
Principais obrigações trabalhistas
e previdenciárias:
>
Relação Anual de Informações Sociais (Rais)
>
Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged)
>
Sistema Empresa de Recolhimento do FGTS (Sefip) e Guia de Recolhimento do FGTS
e Informações à Previdência Social (GFIP)
Principais obrigações
fiscais acessórias:
>
Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF)
>
Declaração do Imposto de Renda Retido na Fonte (DIRF)
Principais obrigações
contábeis:
>
Livro Diário
>
Livro razão
>
Livro de Inventário de bens
>
Livro inventário de estoque
>
Livros auxiliares
>
Escrituração Fiscal Digital (EFD – Contribuições)
>
Escrituração Contábil Fiscal (ECF)
>
Escrituração Contábil Digital (ECD)
Principais obrigações
específicas de organizações do terceiro setor:
>
Sistema de Cadastro e Prestação de Contas (Sicap). Essa obrigação é relativa
especificamente para as fundações privadas, as quais são fiscalizadas pelo
Ministério Público Estadual, conforme visto na forma de constituição das
fundações.
Contabilidade pode
auxiliar na melhor gestão das entidades
Investir
na organização dos documentos, estejam eles em papel ou já em ambiente digital,
pode ser uma boa forma de dar mais tranquilidades às fundações religiosas.
Esses locais normalmente contam com parcos recursos para a realização de cultos
e outras manifestações culturais e religiosas. Muitas instituições realizam
importante trabalho de fortalecimento comunitário, assistência social e fomento
às causas das periferias, da população negra, das mulheres e outras minorias.
Todas
essas ações podem constar na contabilidade da entidade religiosas, exceto nos
casos em que a entidade religiosa passe à categoria de entidade filantrópica.
Por exemplo, no caso de congregações cristãs que administrem universidades ou
escolas, é preciso que haja cadastros separados e a prestação das informações
contábeis em separado, explica o contador Cristiano da Silva Bernardes.
A
consultoria de um profissional contábil vale para também para as pequenas
organizações. Estar em conformidade com o Fisco permite a captação de recursos
junto aos órgãos públicos e a empresas privadas para o sustento das ações. Além
disso, permite a melhor gestão dos recursos. É muito comum que o contador
responsável pela organização das informações e documentos das entidades do
setor preste um serviço de consultoria para a administração dos recursos.
O
contador Ibes Eron Vaz, da Contenge Contabilidade, Engenharia e Gestão, lembra
que a captação de recursos não é uma prática comum entre esse segmento devido à
dificuldade em manter pessoal qualificado para a elaboração de projetos e,
principalmente, pelo ainda baixo índice de grupos regularizados.
Fonte:
Jornal do Comércio
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