A
partir de julho deste ano, uma regra da Receita Federal obrigará todas as
empresas do país a informar ao fisco detalhes da cadeia societária e indicar
quem é, em última instância, de forma direta ou indireta, o seu proprietário.
No
caso de descumprimento, a entidade empresarial terá o CNPJ bloqueado, o que vai
impedir a realização de operações financeiras ou conseguir empréstimos.
Não
estão contempladas na norma, contudo, as empresas com ações negociadas em bolsa
e fundos de investimento, que já são fiscalizados pela Comissão de Valores
Imobiliários (CVM).
Também estão desobrigadas de cumprir a instrução o Banco Central e entidades governamentais ligadas a fundos soberanos, além de entidades de previdência, desde que já reguladas por autoridade governamental.
A
principal mudança instituída pela Instrução Normativa nº 1.634/2016 é a
possibilidade de identificar o administrador de companhias instaladas em outros
países que tenham participações ou controle de empresas, fundos de investimento
ou fundos de pensão no Brasil.
O
objetivo é contribuir para o combate à corrupção e lavagem de dinheiro.
Antes
da determinação, era difícil identificar, por exemplo, o beneficiário final de
uma conta offshore - empresa situada geralmente em paraísos fiscais, utilizadas
para evitar o pagamento de impostos e manter sob sigilo a identidade de seus
proprietários.
Até
então, na hora de abrir uma empresa na junta comercial, se um dos sócios
majoritários fosse uma empresa ou um fundo de investimentos situado em outro
país, a Receita e outros órgãos nacionais de fiscalização e repressão à evasão
fiscal não tinham autoridade legal para rastreá-lo e, eventualmente, aplicar
sanções.
Era
necessário que outros países compartilhassem essas informações.
BOAS PRÁTICAS
O
tributarista Fábio Lunardini, do escritório Peixoto & Cury Advogados,
explica que as exceções são aceitáveis porque se pressupõe que uma companhia de
capital aberto listada na Bolsa de Valores já siga determinadas regras de
governança (controles internos anticorrupção) e transparência.
A
nova regra é mais um passo para combater fraudes fiscais. Como membro associado
da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil
já tinha aderido a duas convenções internacionais que possibilitam trocas de
informações fiscais, patrimoniais e bancárias entre 128 países, medidas que
criaram o chamado "Fisco Global".
Para
especialistas, o endurecimento da fiscalização não afugenta potenciais investidores
no país. Esse controle maior sobre a receita e o patrimônio dos contribuintes,
afirma o advogado especialista em direito societário Rafael Villac, do Peixoto
& Cury, mostra que o Brasil está comprometido em seguir as tendências
globais de transparência fiscal.
"Ao
desbravar os ninhos de rato que são muitas das cadeias societárias, o país
afugenta os corruptos e isso atrai bons investidores", explica.
FRAUDES
Apesar
dos avanços e da legislação mais dura, especialistas alertam que existe a
possibilidade de "consultorias especializadas" encontrarem brechas no
sistema.
"É
um golpe forte na indústria do offshore, mas sozinha a nova regra não será
suficiente para a Receita descobrir o dono final", alerta o advogado
Eduardo Diamantino, sócio da Diamantino Advogados Associados.
A
advogada Vanessa Sprangim, sócia do escritório DGCGT Advogados, afirma que será
preciso esperar a Instrução Normativa entrar em prática para avaliar sua
eficácia. Mas, para ela, o funcionamento da regra pode demorar, porque as empresas
podem não estar preparadas para cumprir as normas.
"A
Receita joga tudo para cima do contribuinte. Mas será que ele terá suporte
financeiro, técnico para cumprir tudo? Será que ele terá acesso fácil a todas
essas informações? Nós não sabemos", questiona.
Em
nota, a própria Receita confirma que seu sistema de fiscalização pode não ser
suficiente para eliminar de uma vez as possibilidades de um empresário se
manter no anonimato.
A
entidade informou que essa regra é uma das soluções encontradas para dificultar
a possibilidade de um beneficiário final esconder sua identidade. Mas, caso
surjam outras maneiras de camuflar um investidor, a Receita poderá
"agravar as regras para tornar cada vez mais inviável a fraude e a
ocultação do beneficiário final".
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