Para
tentar reduzir a fila de ações referentes a processos administrativos
tributários, a Receita Federal resolveu apelar para a tecnologia e testar um
robô nos julgamentos dessas ações. O projeto tornaria os julgamentos até seis
vezes mais rápidos – o que poderia beneficiar tanto o governo quanto o cidadão.
Mas há quem critique o uso de uma máquina para tomar esse tipo de decisão. A
ideia é que o programa de computação, ainda em criação, atue somente em casos
caracterizados pelo baixo valor e grande volume. A proposta é que, pela
semelhança entre eles, possam ser julgados "em lote". Funcionaria
assim: a máquina lê, produz um relatório e sugere um voto. O auditor fiscal,
que hoje atua em todas essas frentes, apenas revisa o trabalho do computador e
encaminha, como já acontece, para votação em uma das turmas das delegacias.
A
Receita estima que casos que ficam em média de três anos na fila, entre a ação
ser protocolada e a solução, poderiam ser analisados seis vezes mais rápido, em
até seis meses.
No
fim de 2017, mais de 250 mil processos administrativos tributários aguardavam
uma decisão das delegacias da Receita Federal. Mais da metade, 57 % (cerca de
142 mil), eram casos gerados por autuações eletrônicas, com solução simples,
como contestações à multa aduaneira ou ao Imposto de Renda, por exemplo, com
valor de até R$ 20 mil. O tempo médio de julgamento desses processos é de três
anos. Só eles, ao fim de 2017, somavam uma expectativa de receita de R$ 53
bilhões, num universo de R$ 118 bilhões.
Análise dos casos deve ser
mais rápida
O
auditor fiscal, André Rocha Nardelli, coordenador-geral de contencioso
administrativo e judicial da Receita Federal, à frente do projeto do robô, diz
que há uma "parte social e arrecadatória" na proposta do robô.
Uma
das consequências da implementação da tecnologia seria a redução do tempo de
análise também dos casos maiores, da média atual de 120 dias, para 90. "A
inteligência artificial vai liberar força de trabalho para atuar nos casos mais
complexos", afirma.
Com
três ou quatro meses de testes pela frente, ainda não se sabe quanto precisará
ser investido para colocar a proposta em prática. Segundo Nardelli, a área de
tecnologia da Receita tem atuado em parceria com empresas, mas não há um
contrato por enquanto. "É como se fosse uma amostra grátis." O
coordenador destaca que, na hora de falar em dinheiro, caberá ao Comitê de
Tecnologia, que se reúne uma vez por mês para avaliar os investimentos na área,
definir as prioridades.
A
análise, nos testes, de 10 mil processos foram muito bem sucedidas, diz André Nardelli, que não acredita em
empecilhos. “Claro que ainda é um projeto e, se a máquina só for capaz de
acertar 50% dos casos, não serve. Mas, se acertar 98%, é viável”.
Proposta de julgamentos
por um robô causa controvérsia
Entre
especialistas, a medida tem gerado controvérsias. Para o professor de
Macroeconomia do Ibmec/SP João Ricardo Costa Filho, o movimento do governo é
positivo. "Ao invés de alocar recursos para uma causa que vai ter baixo
retorno para os cofres públicos, é uma maneira de dar eficiência e cobrar de
fato quem deve."
Para
Costa Filho, quanto mais os órgãos públicos se apropriarem de novas
tecnologias, mais tempo e mais recursos sobrarão para investir em áreas
carentes, como saúde e educação. "Claro que é preciso avaliar até onde
esses algoritmos conseguem resolver esses processos", afirma.
Já
o professor de Finanças Públicas Roberto Piscitelli, da Universidade de
Brasília (UnB), diz que "não é possível que máquinas substituam pessoas em
julgamentos de qualquer tipo". "Seria a mesma coisa que a máquina
fazer diagnóstico a partir dos sintomas revelados pelo paciente."
Piscitelli
considera que o uso dos robôs busca uma padronização dos julgamentos, como se
as situações fossem todas idênticas. "Por mais familiaridades que um
processo possa ter com o outro, sempre há peculiaridades, que precisam de uma
análise pessoal e não de um computador".
Roberto
Piscitelli diz ainda que a intenção de implantar a inteligência artificial
busca "disfarçar a ineficiência" da Receita Federal. "Para
cobrir falhas administrativas, começam a criar soluções mágicas."
Fonte:
Gazeta do Povo
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