Propostas
de reforma tributária proliferam na fila de pautas do Congresso e nos acervos
de estudos acadêmicos. A maioria, entretanto, possui pontos cegos que acabam
limitando sua eficácia. As propostas costumam olhar apenas para os impostos,
ignorando o problema das excessivas, e por vezes desvirtuadas, taxas e
contribuições.
Essa
é a conclusão dos tributaristas Fernando Facury Scaff e Igor Mauler Santiago,
que debateram o tema em encontro do Conselho de Altos Estudos de Finanças e
Tributação (Caeft), da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), realizado
nesta segunda-feira, 14/05.
Dentro
do emaranhado tributário, as taxas de fiscalização começaram a se multiplicar
sem seguir um critério definido. Em geral são voltadas ao controle da
exploração de recursos naturais, como reservas minerais, hídricas e de petróleo
e gás.
Santiago
lembrou que o controle desses recursos é de competência da União, conforme
previsto no artigo 20 da Constituição. Porém, várias taxas de fiscalização são
criadas por Estados e replicadas, inclusive, por municípios.
A
competência fiscalizadora de Estados e municípios sobre esses recursos
dependeria de autorização da União, o que não se verifica em grande parte dos
casos. “O que se tem aqui é um problema de invasão de competência”, disse
Santiago.
Os
números envolvendo essas cobranças são significativos. O Estado do Rio de
Janeiro, por exemplo, prevê a entrada de R$ 1,8 bilhão este ano provenientes da
taxa de fiscalização do petróleo.
Com
a taxa de fiscalização de recursos minerais, o Pará aumentou as receitas em R$
800 milhões e Minas Gerais em R$ 500 milhões.
“São
cobranças Inconstitucionais, mas o Supremo Tribunal Federal (STF) tem se calado
sobre o assunto, o que acabou estimulando a reprodução de taxas semelhantes”,
disse Santiago.
Os
valores cobrados, segundo os tributaristas, não são lógicos. O governo do Pará
aproveitou a inércia do STF sobre o tema e criou outra cobrança, uma taxa de
fiscalização das atividades de exploração de recursos hídricos.
De
acordo com Santiago, o valor arrecadado com ela é sete vezes superior ao
orçamento da secretaria de Meio Ambiente daquele Estado.
Igual
problema ocorre com as contribuições, que muitas vezes são criadas
aproveitando-se de interpretações forçadas das legislações. Fernando Facury
Scaff cita a cobrança de ISS ao longo do trajeto de rodovias que foram
concedidas pelo poder público à iniciativa privada.
Ou
a disputa entre Estados e municípios para tirar uma fatia dos serviços de
streaming por meio do ICMS e também do ISS.
Outro
exemplo é a cobrança de IPTU sobre áreas concedidas, como aeroportos ou
terminais portuários. Segundo os tributaristas, fica claro que tais cobranças
têm caráter unicamente arrecadatório, que muitas vezes não respeitam a
destinação específica prevista para as contribuições, sendo usadas para reduzir
o déficit dos governos.
A
cada remendo na legislação, mais asas se dá à imaginação dos entes
arrecadatórios. O mecanismo da Desvinculação das Receitas da União (DRU) - que
permite ao governo federal dar outra destinação a contribuições cujas receitas
deveriam ser vinculadas ao custeio de algo específico, como assistência social,
por exemplo - levou o governo de Minas a cobrar 20% do montante desvinculado.
A
tese mineira é que se não tem destinação específica, não se trata de
contribuição, e sim de imposto residual que, pela legislação, tem de ser
repartido com os demais entes federativos.
“Mesmo
que esse argumento seja rejeitado, e deve ser, trata-se de um exemplo das
disfunções envolvendo as contribuições”, disse Santiago.
COMO RESOLVER O PROBLEMA?
Para
os tributaristas, as propostas de reforma tributária precisam prever critérios
rigorosos na Constituição e no Código Tributário Nacional para definir a
criação e finalidade das taxas.
Uma
sugestão mais radical seria a extinção das taxas de fiscalização.
Também,
seria necessário fazer a diferenciação clara entre contribuição e impostos, ou
extinguir as contribuições com vinculação de receita de impostos.
Segundo
Scaff, qualquer proposta de reforma tributária vai esbarrar em um limitador,
que é o elevado gasto da máquina pública. “Para fazer uma reforma ampla seria
necessário revisar as receitas e despesas do governo. Os gastos são
descontrolados e a Dívida Ativa da União é de R$ 2 trilhões”, disse Scaff.
Por
isso, segundo ele, as propostas de reforma em análise não projetam redução da
carga tributária. “A reforma possível é a que permitirá simplificar o sistema e
racionalizar a cobrança de tributos”, afirmou. Daí a necessidade de jogar os
holofotes sobre o que os tributaristas chamaram de pontos cegos das propostas
de reforma.
Fonte:
Diário do Comércio
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