Em
uma canetada inesperada, a Receita Federal aumentou em 20% os custos de
contratação dos Micro Empreendedores Individuais (MEIs) e provocou a
insurgência do setor cultural. De surpresa, o Fisco publicou a Instrução
Normativa 1.453, que determina o pagamento de 20% a título de contribuição
previdenciária patronal. Antes, o recolhimento só era exigido para a
contratação de prestadores de Serviços das áreas de hidráulica, eletricidade,
pintura, alvenaria, carpintaria e de manutenção ou reparo de veículos. Agora,
passou a valer para todos os MEIs.
Questionada
pelo DIA, a Receita informou que “a situação inicial criava regra de exceção
incompatível com o princípio da isonomia, pois onerava apenas determinados
tipos de serviço”. Segundo o coordenador do curso de Ciências Contábeis da
Faculdade Santa Marcelina, Reginaldo Gonçalves, o objetivo é evitar que as
empresas substituam empregados celetistas por MEIs. “O governo está em cima de
quem é mão de obra fixa”, avalia.
Para
piorar a situação, a Receita entendeu que a medida é retroativa a 2012, isto é,
quem contratou microempreendedores nos últimos dois anos está com dívida a ser
saldada. A instrução foi publicada em fevereiro, mas as empresas ainda não
sabem ao certo como cumprir as novas determinações. Para os empresários, a
norma é um tiro no pé da própria lei que instituiu o MEI, responsável pela
retirada de milhões de trabalhadores da informalidade.
O
setor cultural, que depende de vários Serviços prestados por
microempreendedores, se revoltou contra a medida e busca revertê-la no governo.
“O MEI foi uma bênção para o nosso segmento. Um prestador de serviço como um
técnico de som, ou um iluminador, não trabalha só para uma empresa, e sim para
diversas produções diferentes. Por isso, ele não seria contratado com carteira.
Com o MEI, ele conseguiu se formalizar”, explica Odilon Wagner, ator e
presidente da Associação dos Produtores Teatrais Independentes. “Se essa medida
continuar, vai ser uma derrocada dos prestadores de serviços”, afirma Wagner.
O
produtor Afonso Borges, do projeto Sempre um Papo, prevê um boicote à
contratação dos MEIs. “Logo agora que a lei estava funcionando, vem essa ideia
terrível. Quem estava contratando formalmente vai voltar para informalidade”,
afirma. Advogados consultados pelas empresas orientam a suspensão da
contratação de MEIs ou o depósito dos 20% em juízo, já que a medida do Fisco
pode cair.
A
esperança dos empresários está na aprovação da Lei do SuperSimples no
Congresso. No substitutivo votado ontem na Câmara, há um dispositivo que
determina o retorno à cobrança original. Para passar a valer, ele ainda precisa
ser aprovado pelo Senado.
Lei do MEI aumentou
formalização no país
Em
vigor desde 2008, a Lei Complementar 128 criou a figura do Microempreendedor
Individual (MEI), que é uma nova categoria de empresa, bastante simplificada e
com menos tributação para os participantes.
Desde
que foi instituída, a lei teve adesão maciça e retirou muitos prestadores de
serviço da informalidade. Em 2010, 49% do total de empresas abertas no país
eram MEIs. Em 2013, esse percentual já representava 68% do total.
A
visibilidade desta categoria impulsionou medidas como a criação, por exemplo,
de uma Moeda social em Maricá (RJ). Criada no ano passado, ela circula entre
negócios locais, fortalecendo o comércio regional.
Para
a cultura, a medida foi especialmente importante, dada a natureza dos prestadores
de serviço na área. Um carregador, por exemplo, pode trabalhar em uma montagem
de exposição, de um show ou de uma peça teatral. Se antes ele vivia do chamado
“bico”, com a lei do MEI ele pode se regularizar e emitir nota fiscal.Para as
empresas, a medida também foi importante. “Devemos sempre prestar contas ao
Fisco, e a formalização facilitou tudo”, afirma Odilon Wagner.
Medida retroativa é
questionada
Apenas
uma palavra foi responsável pela confusão sobre a retroatividade da medida da
Receita. A lei original dos MEIs garantia que o pagamento era devido
“exclusivamente” ao MEI dos Serviços de hidráulica, eletricidade, pintura,
alvenaria, carpintaria e de manutenção ou reparo de veículos.
Em
2012, uma lei complementar retirou o termo “exclusivamente” da redação do
texto. A Receita interpretou que, a partir dessa mudança, o pagamento passou a
ser devido para o MEI de qualquer área, provocando isonomia no setor. Mas
especialistas questionam a legalidade do entendimento, afirmando que o Fisco
adotou essa interpretação a partir da instrução publicada este ano, de forma
que a cobrança não poderia retroagir.
“De
repente, o empresário se depara com um débito que ele não sabia existir”,
afirma Alexandre Marques, sócio do Damasceno & Marques Advocacia. “Isso não
tem o menor cabimento”, afirma Ericka Gavinho, do Gavinho e Campos Associados.
Fonte:
O Dia - RJ
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