Analistas preveem IPCA de
6% neste ano e de 5,5% em 2015. Comitê de Política Monetária terá que pesar a
mão na Selic para conter reajustes, que minam o orçamento das famílias.
Elevação da taxa amanhã deve ser de 0,5 ponto percentual.
Assustada com a escalada
dos preços, a auxiliar de enfermagem Maria José Domingues, 61 anos, recorreu a
um velho costume, herdado do período em que o país vivia sob a marca da
hiperinflação. Ela peregrina, todos os meses, por pelo menos três
supermercados. A busca tem um único objetivo: pagar mais barato. Para isso, ela
não mede esforços. Se percebe que determinado item está caro demais, não pensa
duas vezes. Devolve o produto à prateleira e o substitui por um similar que
caiba no orçamento doméstico. “Recentemente, troquei o inhame pela
batata-inglesa”, disse a auxiliar de enfermagem.
A rotina de Maria Domingues
é repetida por um batalhão de donas de casa que sentiram no bolso o custo da
leniência com a inflação. Nos últimos quatro anos, o Índice de Preços ao
Consumidor Amplo (IPCA), o parâmetro oficial da carestia no país, ficou sempre
acima do centro da meta que deveria ser perseguida pelo governo, de 4,5% ao
ano. Em 2014, não deverá ser diferente. Para cerca de 100 analistas consultados
pelo Banco Central, por meio da pesquisa Focus, o Índice de Preços ao
Consumidor Amplo cravará alta de 6%, quase o limite máximo, de 6,5%, permitido
pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
Mesmo em 2015, seja qual
for o presidente eleito em outubro próximo, a carestia continuará a pressionar
o orçamento do brasileiro. Pela primeira vez, o BC divulgou as projeções para o
próximo ano, e elas são desanimadoras. Pelas contas dos analistas, o IPCA
acumulará elevação de 5,5%. Péssima notícia para Maria Domingues, que, diante
da alta dos preços, teve de mudar a rotina doméstica. Ela costumava fazer bolos
duas vezes por semana. Agora, passou a comprar a guloseima já pronta. “Subiu o
preço do gás, do ovo, do óleo, da margarina e da farinha de trigo, enfim tudo”,
reclamou.
Em 2013, o grupo
alimentação e bebidas aumentou 8,5%, segundo o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE). Também incomodou as donas de casa os gastos com
serviços. Cuidar das unhas, por exemplo, ficou, em média, 11% mais caro. A
explicação para isso, disse o economista-chefe da Gradual Investimentos, André
Perfeito, foi a correção, acima da inflação, do salário mínimo.
“A política de correção do
mínimo (pela inflação do ano anterior e pelo Produto Interno Bruto de dois anos
antes) trouxe benefícios claros à população da classe mais baixa, mas o mesmo
não se pode dizer da classe média. Então, a dona de casa que tinha um padrão de
vida melhor há alguns anos está, agora, sofrendo bastante, porque a renda dela
não acompanhou a alta da inflação”, afirmou.
Desconfiança
A saída encontrada pelo
governo para minimizar a escalada dos preços foi tornar o dinheiro mais caro e
escasso. Desde abril de 2013, a taxa básica de juros da economia, a Selic,
subiu da mínima histórica, de 7,25%, para 10% ao ano, alcançado em dezembro.
Amanhã, o Comitê de Política Monetária (Copom) decidirá pela continuidade da
alta dos juros. Boa parte dos analistas aposta em mais um aumento de 0,5 ponto
percentual, para 10,5% ao ano. No governo, a aposta ainda é de elevação de 0,25
ponto, para que o arrocho não derrube o já frágil ritmo de crescimento da
economia. Os especialistas mais pessimistas apostam que, até fevereiro, a Selic
estará em 11% ao ano.
André Perfeito não
descarta uma dose ainda maior, para 11,25%, na reunião do Copom de abril. “A questão não é o quanto os juros
precisam subir, mas que sinalização o BC dará ao mercado para convencer que
está mesmo disposto a pôr a inflação nos eixos. Hoje, a autoridade monetária
está trabalhando não só para recuperar a credibilidade de suas ações como a de
todo o governo”, frisou.
A mesma avaliação tem o
economista-chefe Austin Rating, Alex Agostini. “Acho que o BC não está
confortável com a inflação atual, mas também não tem dado sinais de que está
perseguindo o centro da meta, de 4,5%”, observou. Para ele, é vital uma
resposta mais firme com a disparada dos preços. “O comunicado do BC sobre o
IPCA do ano passado, uma nota em poucas linhas, não esclareceu nada. O que todo
mundo quer saber é como a autoridade monetária está vendo a inflação. Todos
esperam que o Copom seja muito claro sobre isso na ata dessa reunião. Não pode
haver mais ruídos”, assinalou.
Nada a comemorar
Projeções de indicadores
deste ano e do próximo mostram uma economia bastante ruim
Índices 2014
2015
IPCA 6,00%
5,50%
IGP-DI 5,20%
5,50%
IGP-M 6,00%
5,50%
Dólar R$ 2,45
R$ 2,47
Taxa Selic 10,50%
11,50%
PIB 1,99%
2,48%
Produção industrial 2,20%
3,00%
Preços administrados 4,00%
5,00%
Deficit externo
US$ 71,6 bi US$ 71,1 bi
Fonte: Banco Central
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