As
cada vez mais extensas notas explicativas constantes nos balanços das empresas
brasileiras refletem melhor sua situação financeira ou complicam ainda mais a
vida de quem precisa entendê-la, como os investidores? A indagação foi o ponto
de partida de uma pesquisa feita com 366 companhias não financeiras na qual se
avaliaram 638 itens de divulgação. O resultado do estudo foi apresentado em
11/11/2013 pela professora de contabilidade e controladoria Edilene Santana
Santos, da Escola de Administração de Empresas de São Paulo (Eaesp) da Fundação
Getúlio Vargas (FGV), durante sua exposição no X Seminário Internacional CPC
Normas Contábeis Internacionais, organizado em São Paulo pela Fundação de Apoio
ao Comitê de Pronunciamentos Contábeis (FACPC).
A
conclusão foi desanimadora. Somente 16% das empresas pesquisadas forneceram as
informações conforme os critérios de transparência estabelecidos pelos órgãos
reguladores. Quem lê os balanços passou a despender muito mais tempo para
completar essa tarefa, sem que isso significasse entender melhor as
demonstrações ou ter acesso a dados mais relevantes. “Os investidores pedem
melhores informações, e não mais informações”, afirmou Aldo Bertolucci, membro
observador do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) e representante da
Confederação Nacional da Indústria (CNI), para quem as notas explicativas
dobraram de tamanho desde a adoção das normas internacionais de contabilidade
(IFRS, na sigla em inglês).
O
problema não se restringe ao Brasil. Segundo Edilene, um levantamento realizado
pela Securities and Exchange Commission (SEC) — congênere norte-americana da
Comissão de Valores Mobiliários (CVM) — com 183 empresas de diversos países
mostrou numerosas deficiências em suas notas explicativas. Duas grandes
companhias telefônicas dão o tom das distorções. A britânica Vodafone escreveu
as suas em 44 páginas. A Portugal Telecom precisou de mais de 100 folhas.
Apesar de ter ocupado menos da metade do espaço de sua concorrente lusitana, as
explicações da Vodafone foram consideradas melhores e mais adequadas às normas
que regem os balanços.
“No
mundo todo, houve crescimento no volume de dados das notas explicativas, porém
com queda na qualidade das informações”, disse Amaro Luiz de Oliveira Gomes,
membro do conselho do International Accounting Standards Board (IASB, o Comitê
Internacional de Normas de Contabilidade). A entidade promoveu um seminário em
janeiro, em Londres, na Inglaterra, a fim de tratar do problema e oferecer
sugestões para aprimorar as notas explicativas. Uma delas é esclarecer a
aplicação do princípio de materialidade e, com base nele, publicar somente
informações concretas.
De
acordo com Amaro Gomes, percebe-se que, sobretudo nos primeiros anos depois da
adoção das IFRS (normas internacionais de contabilidade estabelecidas pelo
IASB), ocorre nas notas explicativas o que vem sendo chamado de checklist
(lista de verificação): cada pronunciamento do IASB é entendido como obrigação
de divulgação, sem levar em conta a materialidade do fato. Em decorrência
disso, redigem-se textos que mais complicam que esclarecem as razões do
desempenho da empresa. Há casos de companhias que simplesmente reproduzem nas
notas explicativas as normas baixadas pelo IASB, sem nenhum valor informativo.
No
âmbito doméstico, o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) vai reunir-se em
dezembro para propor medidas que melhorem a qualidade das notas explicativas e
submetê-las à consulta pública. “Temos de buscar formas mais equilibradas e
menos custosas para isso”, afirmou Aldo Bertolucci, da CNI, para quem o Brasil
ainda é um país medieval em termos de publicação de balanços, em razão da
obrigatoriedade de que ainda sejam impressos em jornais, mesmo com a
popularização da internet.
Ana
Novaes, diretora da CVM, explicou que a publicação dos balanços em jornais é
uma exigência estabelecida em lei e isso só pode ser mudado pelo Congresso
Nacional. A forma de divulgação de fatos relevantes, porém, está no âmbito das
atribuições da CVM, que realizou consulta pública sobre a possibilidade de usar
portais de notícias na internet para esse fim. A audiência pública foi
encerrada em 10/10/2013 e agora em fase de análise das manifestações.
Quanto
às notas explicativas, Ana Novaes foi taxativa. Para ela, não vale pôr a culpa
da prolixidade dos textos às exigências dos órgãos reguladores. “A exposição
dos riscos financeiros da Sadia estava registrada em suas demonstrações
contábeis, porém não de forma clara o suficiente para o público interessado.
Deu no que deu”, exemplificou. A Sadia teve prejuízos bilionários no final de
2008 com operações cambiais que só não a levaram à bancarrota porque a empresa
acabou sendo absorvida pela concorrente Perdigão, no começo do ano seguinte, na
operação que resultou na criação da BRF. “Por isso, as notas explicativas têm
de ser claras, relevantes e sem abobrinhas”, resumiu Ana Novaes.
Fonte:
Revista Dedução
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